Há muita conversa acerca da economia do hidrogénio. No melhor dos casos ela é ingénua, e no pior desonesta. Uma economia do hidrogénio seria na verdade uma coisa lamentável e paupérrima.
Há um certo nĂşmero de problemas com as pilhas de combustĂvel (fuel cells). Muitos deles referem-se ao engineering e provavelmente poderiam ser superados. Mas há um viĂ©s básico que nunca poderá ser ultrapassado:
O hidrogénio livre não é uma fonte de energia — ele é um vector (carrier) de energia. O hidrogénio livre não existe neste planeta, de modo que para obtê-lo temos de romper moléculas que o contenham.
Isto é devido à Segunda Lei da Termodinâmica, e não há volta a dar-lhe. Estamos a trabalhar com catalisadores que ajudarão a reduzir a energia necessária para gerar hidrogénio livre, mas sempre haverá uma perda de energia, e os próprios catalisadores tornar-se-ão terrivelmente caros se tiverem de ser fabricados numa escala consentânea com as actuais exigências de energia dos transportes.
Praticamente todo o hidrogénio livre hoje produzido é obtido a partir do gás natural. Assim, sem qualquer dúvida, não podemos escapar à nossa dependência dos hidrocarbonetos não renováveis.
Esta matéria-prima é tratada com vapor a fim de retirar o hidrogénio das moléculas de metano. E o vapor é produzido por água a ferver produzida com gás natural.
Globalmente, há cerca de 60% de perda de energia neste processo. E, como está dependente da disponibilidade de gás natural, o preço do hidrogénio produzido por este método será sempre um múltiplo do preço do gás natural.
Ah!, mas existe uma fonte inexaurĂvel de água a partir da qual poderĂamos obter o nosso hidrogĂ©nio. Contudo, separar hidrogĂ©nio da água exige um ainda mais elevado investimento de energia por unidade de água (286kJ pormol ).
Todos os processo de dividir moléculas de água, incluindo sobretudo a electrólise e a decomposição térmica, exigem grandes investimentos de energia, tornando-as inúteis.
Os advogados do hidrogénio gostam de destacar que o desenvolvimento de células solares ou parques eólicos proporcionariam energia renovável que poderia ser utilizada para obter hidrogénio. A energia exigida para produzir 1 TWh (1 Terawatt-hora = 10 9 kWh) de hidrogénio é 1,3 TWh de electricidade.
Mesmo com avanços recentes na tecnologia do fotovoltaico, os conjuntos de placas com células solares seria enormes, e teriam de ser dispostas em áreas iluminação solar adequada.
TambĂ©m devemos considerar a água a partir da qual obterĂamos este hidrogĂ©nio. Para cumprir as nossas actuais necessidades de transportes, terĂamos de divergir 5% do fluxo do Rio Mississipi.
Isto exigiria ainda mais energia, mais uma vez reduzindo os proveitos do hidrogĂ©nio. Esta água teria entĂŁo de ser entregue a um conjunto de placas fotovoltaicas da dimensĂŁo das Grandes PlanĂcies (Great Plains). Demasiado para a agricultura.
O único meio de a produção de energia poder aproximar-se da praticalidade é através da utilização de centrais nucleares. Para gerar a quantidade de energia utilizada actualmente pelos Estados Unidos seriam precisos 900 reactores nucleares adicionais, a um custo de aproximadamente US$ 1 mil milhões por reactor.
Actualmente existem apenas 440 reactores nucleares a operarem em todo o mundo. A menos que aperfeiçoemos muito depressa os reactores reprodutores rápidos (breeders), haverá uma escassez de urânio muito antes de termos acabado o nosso programa de construção de reactores.
Mesmo o hidrogénio derivado da energia nuclear seria caro. Abastecer um carro com hidrogénio equivalente a 15 galões (56,7 litros) de gasolina poderia custar até US$ 400.
Se o hidrogénio estivesse em forma gasosa, o seu reservatório teria de ser suficientemente grande para guardar 178.500 litros. A compressão do hidrogénio reduziria a dimensão do reservatório de armazenagem a um décimo. E o hidrogénio liquefeito exigir um reservatório com apenas quatro vezes a dimensão do reservatório de gasolina.
Por outras palavras, um reservatório de gasolina com 15 galões seria o equivalente a um reservatório de hidrogénio com 60 galões (226,8 litros). E, naturalmente, transportar uma quantidade de hidrogénio com a energia equivalente para o posto de abastecimento exigiria 21 vezes mais camiões do que para a gasolina.
O hidrogĂ©nio comprimido e liquefeito apresenta problemas que lhe sĂŁo inerentes. Ambas as tĂ©cnicas exigem energia e assim, mais uma vez, reduz o rácio de energia lĂquida do hidrogĂ©nio.
O hidrogĂ©nio liquefeito Ă© bastante frio para congelar o ar, o que leva a problemas com acĂşmulos de pressĂŁo devido Ă obstrução de válvulas. Ambas as formas de armazenagem de hidrogĂ©nio sĂŁo passĂveis de fugas. De facto, todas as formas de hidrogĂ©nio puro sĂŁo difĂceis de armazenar.
O hidrogénio é o elemento mais pequeno e, como tal, pode escapar de qualquer contentor, não importa quão bem selado esteja ele. O hidrogénio em armazenagem evaporará à taxa de pelo menos 1,7% ao dia.
NĂŁo poderemos armazenar veĂculos a hidrogĂ©nio em edifĂcios. Nem tĂŁo pouco podemos permitir que eles estacionem ao sol. E como o hidrogĂ©nio atravessa metais, ele provoca uma reacção quĂmica que torna os metais quebradiços. As fugas de hidrogĂ©nio tambĂ©m poderiam ter um efeito adverso tanto no aquecimento global como na camada de ozono.
O hidrogĂ©nio livre Ă© extremamente reactivo. Ele Ă© dez vezes mais inflamável do que a gasolina, e vinte vezes mais explosivo. E a chama do hidrogĂ©nio Ă© invisĂvel.
Isto faz com que se torne muito perigoso trabalhar com ele, particularmente em postos de abastecimento e veĂculos de transporte. Os acidentes de tráfego teriam uma tendĂŞncia a serem catastrĂłficos. E há a possibilidade de que veĂculos mais velhos pudessem explodir mesmo sem qualquer colisĂŁo.
Ă€ cabeça de tudo isto devemos considerar a terrĂvel despesa de converter da gasolina para o hidrogĂ©nio. A infraestrutura teria de ser construĂda virtualmente a partir do nada, a um custo de milhares de milhões. A nossa infraestrutura de petrĂłleo e gás natural evoluiu ao longo do sĂ©culo passado, mas esta transição para o hidrogĂ©nio teria de ser feita em 20 anos ou menos.
Os engenheiros da indústria automóvel não acreditam que alguma vez tenhamos uma economia do hidrogénio. A Daimler-Chrysler admitiu isto. Ao invés de desenvolver uma economia do hidrogénio, faz mais sentido — e fará sempre mais sentido — comprar um carro mais eficiente, usar transporte público, andar de bicicleta ou ir a pé.
Autor de The End of the Oil Age.